Todos os átomos neutros, exceto o hidrogênio, têm mais de um elétron e são conhecidos como átomos polieletrônicos. Esta seção se baseia na descrição do átomo de hidrogênio para explicar como a presença de mais de um elétron afeta as energias dos orbitais atômicos e o modo como eles são ocupados. As estruturas eletrônicas resultantes são a chave das propriedades periódicas dos elementos e da capacidade dos átomos de formar ligações químicas. Este material, portanto, embasa quase todos os aspectos da química.
No átomo de hidrogênio, com um elétron, não ocorre repulsão elétron-elétron e todos os orbitais de uma determinada camada são degenerados (têm a mesma energia). Por exemplo, o orbital e os três orbitais têm a mesma energia. No entanto, cálculos e experimentos em espectroscopia com átomos polieletrônicos mostraram que as repulsões elétron-elétron tornam a energia dos orbitais 2p mais alta do que a de um orbital . O mesmo ocorre na camada n 53, em que os três orbitais 3p ficam acima do orbital e os cinco orbitais 3d ficam ainda mais altos. Como explicar essas diferenças de energia?
Assim como é atraído pelo núcleo, cada elétron de um átomo de muitos elétrons é repelido pelos demais elétrons. Como resultado, ele está menos fortemente ligado ao núcleo do que estaria na ausência dos outros elétrons. Cada elétron é blindado pelos demais contra a atração total do núcleo. A blindagem reduz efetivamente a atração entre o núcleo e os elétrons. A carga nuclear efetiva, , sentida pelo elétron, é sempre menor do que a carga nuclear real, , porque as repulsões elétron-elétron trabalham contra a atração do núcleo. Uma aproximação grosseira da energia de um elétron em um átomo polieletrônico é uma versão da Equação 2b, em que a carga nuclear verdadeira é substituído pelo carga nuclear efetiva: Observe que os demais elétrons não bloqueiam a influência do núcleo. Eles criam simplesmente um interação repulsiva coulombiana adicional que corrige parcialmente a atração do núcleo sobre os elétrons. A atração do núcleo sobre os elétrons no átomo de hélio, por exemplo, é menor do que aquela que a carga deveria exercer, mas é maior do que a carga que seria esperada se cada elétron balanceasse exatamente uma carga positiva.
Um elétron de qualquer das camadas pode ser encontrado em uma região muito próxima do núcleo (lembre-se de que , para um orbital , é diferente de zero no núcleo), e dizemos que ele penetra as camadas internas. Um elétron penetra muito menos, porque o momento angular do orbital impede a aproximação entre o elétron e o núcleo (Figura 1). Vimos que sua função de onda se anula no núcleo; logo, a densidade de probabilidade do elétron no núcleo é zero para um elétron . Como o elétron penetra menos que um elétron as camadas internas do átomo, ele está mais efetivamente blindado em relação ao núcleo e, por isso, experimenta uma carga efetiva menor do que a de um elétron . Em outras palavras, um elétron s está mais firmemente ligado ao núcleo do que um elétron e tem energia ligeiramente menor (mais negativa). Um elétron está menos firmemente ligado ao núcleo do que um elétron da mesma camada, porque o momento angular orbital é maior e o elétron é menos capaz ainda de se aproximar do núcleo. Isso significa que os elétrons d têm energia mais alta do que os elétrons p da mesma camada, que, por sua vez, têm energia mais alta do que os elétrons daquela camada.
Os efeitos da penetração e da blindagem podem ser grandes. Um elétron costuma ter energia muito mais baixa do que um elétron ou . Ele pode até ter energia inferior à de um elétron do mesmo átomo. A ordem precisa da energia dos orbitais depende do número de elétrons no átomo, como será explicado a seguir.
Por causa dos efeitos da penetração e da blindagem, a ordem das energias dos orbitais em uma dada camada em um átomo polieletrônico é .
A estrutura eletrônica de um átomo determina suas propriedades químicas e, por isso, é preciso ser capaz de descrever essa estrutura. Para isso, você escreve a configuração eletrônica do átomo — uma lista de todos os orbitais ocupados, com o número de elétrons que cada um contém. No estado fundamental de um átomo com muitos elétrons, os elétrons ocupam os orbitais atômicos disponíveis, de modo a tornar a energia total do átomo a menor possível. À primeira vista, poderíamos esperar que um átomo tivesse a menor energia quando todos os seus elétrons estivessem no orbital de menor energia (o orbital 1s). Porém, exceto para o hidrogênio e o hélio, que só têm dois elétrons, isso não pode acontecer. Em 1925, o cientista austríaco Wolfgang Pauli descobriu uma regra fundamental sobre os elétrons e orbitais, conhecida hoje como princípio da exclusão de Pauli:
Diz-se que os spins de dois elétrons estão emparelhados se um é e o outro, . Os spins emparelhados são representados como , e os elétrons com spins emparelhados têm números quânticos magnéticos de spin de sinais opostos. Como um orbital atômico é determinado por três números quânticos (, e ) e os dois estados de spin são especificados por um quarto número quântico, , outra forma de expressar o princípio da exclusão de Pauli é:
O átomo de hidrogênio tem, no estado fundamental, um elétron no orbital . Essa estrutura é representada por uma seta no orbital de um diagrama de caixas, que mostra cada orbital como uma caixa que pode conter, no máximo, dois elétrons: Sua configuração eletrônica, isto é, uma lista dos orbitais ocupados, é representada por (“um um”). No estado fundamental do átomo de hélio (), os dois elétrons estão em um orbital , que é descrito como (“um dois”): Como se pode ver, os dois elétrons estão emparelhados. Nessa situação, o orbital e a camada estão completamente ocupados. O átomo de hélio no estado fundamental tem a camada fechada, isto é, uma camada em que o número de elétrons é o máximo permitido pelo princípio da exclusão.
Quando um único elétron ocupa um orbital, escrevemos, por exemplo, e não , de forma abreviada.
O lítio () tem três elétrons. Dois elétrons ocupam o orbital e completam a camada . O terceiro elétron deve ocupar o próximo orbital de mais baixa energia disponível, o orbital . Logo, o estado fundamental de um átomo de lítio é : Imagine que a estrutura eletrônica deste átomo é formada pelo caroço, parte central que contém os elétrons de orbitais totalmente preenchidos, circundado pelos elétrons de valência (os da camada mais externa). No lítio, o caroço é formado por uma camada fechada semelhante ao caroço do átomo de hélio, representado por . Este caroço é rodeado por uma camada externa que contém um elétron , de energia mais alta. Assim, a configuração do lítio é . Em geral, somente os elétrons de valência podem se envolver em reações químicas porque os elétrons do caroço estão nos orbitais internos de menor energia e, portanto, estão muito fortemente ligados. Isso significa que o lítio perde somente um elétron ao formar compostos, isto é, ele forma normalmente íons , e não íons ou .
O elemento com é o berílio, , com quatro elétrons. Os primeiros três elétrons tomam a configuração , como o lítio. O quarto elétron emparelha-se com o elétron , para dar a configuração , ou, mais simplesmente, : Um átomo de tem, então, um caroço semelhante ao do hélio, rodeado por uma camada de valência com dois elétrons emparelhados. Como o lítio — e pela mesma razão —, um átomo de só pode perder seus elétrons de valência em reações químicas. Assim, ele perde ambos os elétrons para formar o íon .
O boro () tem cinco elétrons. Dois ocupam o orbital e completam a camada . Dois ocupam o orbital . O quinto elétron ocupa um orbital da próxima subcamada disponível, que é um orbital . Este arranjo de elétrons corresponde à configuração ou : que mostra que o boro tem três elétrons de valência em torno de um caroço semelhante ao do hélio.
Temos de tomar outra decisão no caso do carbono (): o sexto elétron pode ficar junto ao anterior no orbital ou deve ocupar um orbital diferente? (Lembre-se de que existem três orbitais na subcamada, todos com a mesma energia.) Para responder essa questão, é preciso reconhecer que os elétrons estão mais longe um do outro e se repelem menos quando ocupam orbitais diferentes do que quando ocupam o mesmo orbital. Portanto, o sexto elétron ocupa um dos orbitais vazios e o estado fundamental do carbono é Os orbitais são representados desta forma somente quando é necessário enfatizar que os elétrons ocupam orbitais diferentes da mesma subcamada. Na maior parte das situações, a forma compacta, como em , é suficiente. Observe que, no diagrama de orbitais, os dois elétrons foram representados com spins paralelos (), para indicar que eles têm os mesmos números quânticos magnéticos de spin. Por razões baseadas na mecânica quântica, dois elétrons com spins paralelos tendem a se repelir. Portanto, esse arranjo tem energia ligeiramente menor do que a do arranjo com elétrons emparelhados. Entretanto, esse tipo de arranjo só é possível quando os elétrons ocupam orbitais diferentes.
Este procedimento é chamado de princípio da construção e pode ser resumido em duas regras. Para predizer a configuração do estado fundamental de um elemento com o número atômico e seus elétrons:
A primeira regra leva em conta o princípio da exclusão de Pauli. A segunda regra é conhecida como regra de Hund, em homenagem ao espectroscopista alemão Friedrich Hund, que a propôs. Esse procedimento dá a configuração do átomo que corresponde à energia total mais baixa, levando em conta a atração dos elétrons pelo núcleo e a repulsão dos elétrons. Quando os elétrons de um átomo estão em estados de energia mais altos do que os preditos pelo princípio da construção, dizemos que o átomo está em um estado excitado. A configuração eletrônica , por exemplo, representa um ,estado excitado do átomo de carbono.
Um estado excitado é instável e emite um fóton quando o elétron retorna ao orbital que restabelece o estado de energia mínima do átomo.
Em geral, você deveria imaginar um átomo de qualquer elemento como um caroço de gás nobre rodeado pelos elétrons da camada de valência, a camada ocupada mais externa. A camada de valência é a camada ocupada com o maior valor de .
O nitrogênio tem e mais um elétron do que o carbono, o que dá . Cada elétron ocupa um orbital diferente e os três têm spins paralelos: O oxigênio tem e mais um elétron do que o nitrogênio, logo, sua configuração é e dois dos elétrons estão emparelhados: O flúor, por sua vez, com , tem mais um elétron do que o oxigênio, e a configuração , com um elétron desemparelhado. O neônio, com , tem mais um elétron do que o flúor. Esse elétron completa a subcamada , levando a : De acordo com a Figura 1, o próximo elétron ocupa o orbital , o orbital de menor energia na próxima camada. A configuração do sódio é, então, , ou, de forma mais resumida, , em que é um caroço semelhante ao do neônio.
Apresente a configuração eletrônica dos átomos no estado fundamental.
Os orbitais e da camada se completam no argônio, , um gás incolor, sem cheiro, não reativo, que lembra o neônio. A energia do orbital é ligeiramente menor do que a dos orbitais . Isso faz com que o próximo orbital a ser preenchido depois do seja o . Então, as duas próximas configurações eletrônicas são para o potássio e para o cálcio, em que representa um caroço semelhante ao do argônio, . Neste ponto, entretanto, os orbitais começam a ser ocupados.
Em função da ordem do aumento da energia (Fig. 1C.2.1), os próximos 10 elétrons (do escândio, com , até o zinco, com ) ocupam os orbitais . A configuração eletrônica do estado fundamental do escândio, por exemplo, é , e a de seu vizinho, o titânio, é . Observe que, a partir do escândio, os elétrons são escritos depois dos elétrons : assim que contiverem elétrons, os orbitais terão menor energia do que os orbitais (a mesma relação é verdadeira para os orbitais e ). Essas diferenças em energia são resultado das complexidades causadas pela repulsão entre elétrons. Os elétrons são adicionados sucessivamente aos orbitais à medida que aumenta. Entretanto, existem duas exceções: a configuração eletrônica experimental do cromo é , não , e a do cobre é , não . Essa discrepância aparente ocorre porque a configuração com a subcamada semipreenchida e a configuração com a subcamada completa , segundo a mecânica quântica, têm energia mais baixa do que a indicada pela teoria simples. Como resultado, pode-se alcançar uma energia total mais baixa quando um elétron ocupa um orbital , em vez do orbital esperado, se esse arranjo completa uma meia subcamada ou uma subcamada completa.
Os elétrons só ocupam os orbitais se os orbitais estiverem completos. A configuração do germânio, , por exemplo, é obtida pela adição de dois elétrons aos orbitais depois de completar a subcamada . O arsênio tem mais um elétron e a configuração é .
O próximo da fila para ocupação é o orbital , seguido pelos orbitais . Nesse caso, a energia do orbital cai abaixo da energia do orbital após a acomodação de dois elétrons no orbital . Um efeito semelhante ocorre quando outro conjunto de orbitais internos, os orbitais , começa a ser ocupado. O cério, por exemplo, tem a configuração . Os elétrons continuam a ocupar os sete orbitais , que se completam após a adição de 14 elétrons no itérbio, . Em seguida, os orbitais são ocupados. Os orbitais só são ocupados depois que os orbitais , e estão completos no mercúrio. O tálio, por exemplo, tem configuração . Existe uma série de discrepâncias aparentes na ordem de preenchimento dos orbitais . Essas discrepâncias aparentes ocorrem porque os orbitais e têm energias muito próximas. Na verdade, níveis de energia muito próximos são responsáveis pelo fato de aproximadamente um quarto dos elementos terem configurações eletrônicas que, de algum modo, se desviam dessas regras. Entretanto, para a maior parte dos elementos, elas são um guia útil e um bom ponto de partida para todos eles.
Apresente a configuração eletrônica dos átomos no estado fundamental.
A configuração eletrônica do estado fundamental de um átomo é predita usando o princípio da construção (junto com a Figura 3), o princípio da exclusão de Pauli e a regra de Hund.