As estruturas de Lewis mostram os elos entre os átomos e a presença de pares isolados. Porém, exceto em casos simples, estas estruturas não dizem nada sobre como os átomos estão arranjados no espaço. Neste tópico, as ideias de Lewis são discutidas para ajudá-lo a predizer a forma de moléculas simples.
Considere uma molécula formada por um átomo central ao qual os outros átomos estão ligados. Muitas dessas moléculas têm a forma das figuras geométricas apresentadas na Fig. 1G.1.1. Assim, é um tetraedro, é um octaedro e é uma bipirâmide trigonal.
Em muitos casos, os ângulos de ligação, isto é, os ângulos entre ligações adjacentes (as linhas retas que unem os núcleos ao átomo central), são fixados pela simetria da molécula. Esses ângulos de ligação são mostrados na Figura 1. Assim, o ângulo de é (o ângulo do tetraedro), os ângulos de são e , e os ângulos do são , e . Os ângulos de ligação de moléculas que não são determinados pela simetria têm e ser determinados experimentalmente. O ângulo de ligação da molécula angular , por exemplo, é, experimentalmente, igual a , e o ângulo da molécula , uma pirâmide trigonal, é . A principal técnica experimental para determinar os ângulos de ligação de moléculas pequenas é a espectroscopia, especialmente as espectroscopias rotacional e vibracional. A difração de raios X é usada para moléculas maiores. Conhecer as formas das moléculas e os seus ângulos de ligação é essencial no projeto de um novo fármaco utilizando técnicas computacionais.
As estruturas de Lewis (Tópico 1D) mostram apenas como os átomos estão ligados e como os elétrons estão arranjados em torno deles. O modelo da repulsão dos pares de elétrons da camada de valência (modelo VSEPR) amplia a teoria da ligação química de Lewis incluindo regras para explicar as formas das moléculas e os ângulos de ligação:
Estas localizações mais distantes descrevem a configuração eletrônica da molécula. Após a identificação deste arranjo, a posição dos átomos é determinada e a forma da molécula é estabelecida com base na Fig. 1G.1.1. Observe que, para nomear a forma da molécula, apenas a posição dos átomos é considerada. Os pares isolados que possam estar presentes no átomo central são ignorados, mesmo que afetem esta forma.
A molécula do tem apenas dois átomos ligados ao átomo central. Não existem pares isolados de elétrons no átomo central. A posição na qual os pares ligantes estão mais afastados é quando eles se encontram em lados opostos do átomo de e o arranjo dos elétrons é linear. Os átomos de estão, portanto, em lados opostos do átomo de e o modelo VSEPR prediz a forma linear para a molécula de , com um ângulo de ligação igual a :
A molécula do trifluoreto de boro, , tem três pares ligantes no átomo central e nenhum par isolado. De acordo com o modelo VSEPR, para ficarem o mais afastados possível, os três pares ligantes têm de estar nos vértices de um triângulo equilátero. O arranjo de elétrons é trigonal planar. Como um átomo de flúor liga-se a um dos pares de elétrons, a molécula é trigonal planar e os três ângulos são iguais a :
O metano, , tem quatro pares ligantes no átomo central. Para ficarem o mais afastados possível, os quatro pares devem estar em um arranjo tetraédrico em torno do átomo de . Como o arranjo de elétrons é tetraédrico e um átomo de liga-se a cada um dos pares de elétrons, o modelo VSEPR prediz que a molécula seja tetraédrica, com ângulos de ligação de :
Na molécula de pentacloreto de fósforo, , existem cinco pares ligantes e nenhum par isolado no átomo central. De acordo com o modelo VSEPR, os cinco pares e os átomos a que eles se ligam devem estar afastados o máximo possível em um arranjo de bipirâmide trigonal. Nesse arranjo, três átomos (os átomos equatoriais) estão nos vértices de um triângulo equilátero, com ângulos de ligação iguais a . Os outros dois átomos (os átomos axiais) estão acima e abaixo do plano do triângulo, em ângulos de em relação aos átomos equatoriais. A forma prevista da molécula é bipirâmide trigonal:
A molécula de hexafluoreto de enxofre, , tem seis átomos ligados ao átomo central de , que não tem pares isolados. De acordo com o modelo VSEPR, o arranjo de elétrons octaédrico, com quatro pares nos vértices de um quadrado planar e os dois outros pares acima e abaixo do plano do quadrado. Um átomo de está ligado a cada par de elétrons, o que indica que a molécula é octaédrica, com ângulos de ligação de e :
Os seis átomos terminais são equivalentes em uma molécula octaédrica regular.
A segunda regra do modelo VSEPR diz respeito ao tratamento de ligações múltiplas:
Dito de outra forma, os dois pares de elétrons de uma ligação dupla permanecem juntos e repelem outras ligações ou pares isolados como se fossem uma unidade. Os três pares de elétrons de uma ligação tripla também ficam juntos e agem como uma única região de alta concentração de elétrons. Assim, a molécula de dióxido de carbono, , tem estrutura semelhante à da molécula de , mesmo com as ligações duplas:
No íon carbonato, , os dois pares de elétrons da ligação dupla são tratados como uma unidade, e a forma resultante é trigonal planar:
Seja simples ou múltipla, toda ligação age como uma unidade. Portanto, para contar o número de regiões de alta concentração de elétrons, basta contar o número de átomos ligados ao átomo central e adicionar o número de pares isolados.
Quando existe mais de um átomo central, as ligações de cada átomo são tratadas de modo independente. Como exemplo, para predizer a forma de uma molécula de eteno, , cada átomo de carbono é considerado separadamente. Com base na estrutura de Lewis, observe que cada átomo de carbono tem três regiões de alta densidade eletrônica (duas ligações simples e uma ligação dupla):
O arranjo ao redor de cada átomo de carbono é, então, trigonal planar. Há dois átomos de e um átomo de ligados ao átomo de central. Assim, você pode predizer que os ângulos e estarão próximos de . Essa estimativa é confirmada em laboratório (os valores medidos são e , respectivamente). Observações experimentais também mostraram que os seis átomos estão no mesmo plano.
O modelo VSEPR trata ligações simples e múltiplas como equivalentes, não importa que estruturas de Lewis contribuam para a estrutura de ressonância que estamos considerando. Por exemplo, a descrição do íon nitrato, baseada na ressonância diz que ele tem três ligações em torno do átomo central (Tópico 1D). Logo, você pode esperar que a molécula seja trigonal plana.
Segundo o modelo VSEPR, as regiões de concentração elevada de elétrons ocupam posições que maximizam a separação entre elas. Os pares de elétrons em uma ligação múltipla são tratados como uma unidade. A forma da molécula é identificada com base nas posições relativas de seus átomos.
A fórmula VSEPR geral, , é útil para identificar as diferentes combinações de átomos e pares isolados ligados ao átomo central: A representa o átomo central, um átomo ligado e um par isolado. As moléculas de mesma fórmula VSEPR têm essencialmente o mesmo arranjo de elétrons e a mesma forma. Assim, ao reconhecer a fórmula, você pode predizer a forma (mas não necessariamente o valor numérico preciso dos ângulos de ligação que não são governados pela simetria). Por exemplo, a molécula , que contém três átomos de flúor ligados e nenhum par isolado em , é um exemplo de uma espécie , assim como o íon . O íon sulfito, , que tem um par de elétrons isolados no átomo de , é um exemplo de espécie , assim como .
Se não existirem pares isolados no átomo central (uma molécula ), cada região de alta concentração de elétrons tem um átomo ligado, e a forma é a mesma do arranjo de elétrons. Se pares isolados de elétrons estão presentes, a forma da molécula é diferente da do arranjo de elétrons, porque somente as posições dos átomos ligados são levadas em consideração na determinação da forma. Por exemplo, as quatro regiões de alta concentração de elétrons no estarão suficientemente afastadas se adotarem o arranjo tetraédrico (Figura 2). Todavia, a forma do íon é determinada somente pela localização dos átomos. Como três dos vértices do tetraedro estão ocupados pelos átomos e um é ocupado pelo par isolado, o íon é uma pirâmide trigonal:
Uma regra importante é
Um elétron desemparelhado no átomo central é tratado como uma região de alta concentração de elétrons e atua como um par isolado na determinação da forma da molécula. Assim, radicais como têm um elétron não ligante. Logo, o tem um arranjo trigonal planar de elétrons (incluindo o elétron desemparelhado de ), mas sua forma, a configuração de seus átomos, é angular:
Até agora os pares de elétrons foram tratados como átomos quanto ao efeito na forma. Mas isso está correto? O arranjo dos elétrons do íon é tetraédrico. Por isso, é provável que os ângulos sejam de . No entanto, observações experimentais mostraram que, embora o íon sulfito tenha estrutura de pirâmide trigonal, o ângulo de ligação é de apenas . Dados experimentais como esses mostram que o modelo VSEPR, como foi descrito, é incompleto e deve ser melhorado.
Para explicar os ângulos de ligação menores em moléculas com pares isolados, o modelo VSEPR trata os pares isolados como se exercessem maior repulsão do que os pares de ligação. Dito de outro modo, o par isolado empurra os átomos ligados ao átomo central uns contra os outros. Uma possível explicação desse efeito é que a nuvem eletrônica de um par isolado ocupa um volume maior do que a de um par ligado (ou vários pares ligados, nas ligações múltiplas) que está preso a dois átomos, não a um. Em resumo, a regra abaixo ajuda a obter predições segundo o modelo VSEPR com confiabilidade razoável:
Portanto, devido à forte repulsão, a energia mais baixa é atingida quando os pares isolados estão em posições as mais afastadas possíveis. A energia também é mais baixa se os átomos ligados ao átomo central estiverem afastados dos pares isolados, ainda que isso aproxime os átomos uns dos outros.
O modelo melhorado ajuda a explicar o ângulo de ligação do íon sulfito, . Os pares de elétrons adotam um arranjo tetraédrico ao redor do átomo de . No entanto, o par isolado exerce uma forte repulsão sobre os elétrons ligantes, forçando-os a se aproximar. Como resultado desse ajuste de posições, o ângulo se reduz de , do tetraedro regular, para quando observado experimentalmente. Note que, embora o modelo VSEPR prediga a direção da distorção, ele não informa sua extensão. Você perceberá que, em qualquer espécie , o ângulo será menor do que , mas seu valor real não pode ser previsto: ele precisa ser medido experimentalmente ou calculado resolvendo a equação de Schrödinger numericamente em um computador.
A Regra 4 permite predizer a posição em que o par isolado está. Por exemplo, o arranjo dos elétrons de uma molécula ou íon , como o , é uma bipirâmide trigonal, mas existem duas posições possíveis para o par isolado:
Portanto, obtém-se menor energia quando o par isolado está na posição equatorial, produzindo uma molécula com a forma de uma gangorra. A molécula se distorça até que os pares isolados fiquem o mais distantes possível uns dos outros e dos pares ligantes, por isso, átomos se afastam ligeiramente do par isolado:
Uma molécula , como , também tem um arranjo de bipirâmide trigonal de pares de elétrons, mas dois dos pares são pares isolados. Os dois pares estarão o mais afastado possível se ocuparem duas das três posições equatoriais, as quais estão em ângulo de , mas um pouco mais afastados um do outro. O resultado é uma molécula em forma de T:
Se os pares isolados estivessem nas posições axiais, eles formariam ângulos de em relação à posição equatorial, resultando em maior repulsão.
Agora, vejamos uma molécula , que tem um arranjo octaédrico dos pares de elétrons, dois dos quais são pares isolados. Os dois pares estarão mais distantes se estiverem em posições opostas, levando a uma molécula em um arranjo quadrado planar:
Todas as moléculas de mesma fórmula VSEPR têm sempre a mesma forma, embora os ângulos de ligação possam ser um pouco diferentes. Por exemplo, é uma espécie . Ele tem um arranjo de elétrons trigonal planar e uma forma molecular angular. O ângulo de ligação no é , valor este que é um pouco menor do que o valor previsto de para uma molécula trigonal plana. O íon nitrito, , tem a mesma fórmula VSEPR geral (com ângulo de ligação de ) e a mesma forma. O mesmo ocorre com o dióxido de enxofre, , cujo ângulo de ligação é .
Ocorrem exceções, às vezes, quando a diferença de energia entre duas estruturas possíveis é pequena e o átomo central é tão grande que seus pares isolados exercem efeito muito pequeno na molécula. Por exemplo, a molécula é octaédrica, mesmo com o átomo de contendo um par isolado, além de ligações para os seis átomos.
Nas moléculas que têm pares isolados ou um elétron desemparelhado no átomo central, os elétrons de valência contribuem para o arranjo de elétrons em volta do átomo central, mas só os átomos ligados são considerados na identificação da forma. Os pares isolados distorcem a forma da molécula para reduzir as repulsões entre pares isolados e pares ligantes.
Uma ligação covalente polar, na qual os elétrons não estão igualmente distribuídos pelos átomos ligados, tem momento de dipolo diferente de zero (Tópico 2E). Uma molécula polar é uma molécula com momento de dipolo diferente de zero. Uma molécula diatômica é polar se sua ligação for polar. Uma molécula de com sua ligação covalente polar é uma molécula polar: Seu momento de dipolo, igual a , é típico de moléculas diatômicas polares. Todas as moléculas diatômicas formadas por átomos de elementos diferentes têm alguma polaridade. Uma molécula não polar é uma molécula cujo momento de dipolo elétrico é igual a zero. Todas as moléculas diatômicas homonucleares, formadas por átomos do mesmo elemento, como , ou , são não polares devido a suas ligações não polares.
Uma molécula poliatômica pode ser não polar mesmo se suas ligações forem polares. Por exemplo, os dois momentos de dipolo do dióxido de carbono, uma molécula linear, apontam para direções opostas e se cancelam. Por essa razão, o é uma molécula não polar. No caso da água, os dois dipolos formam um ângulo de entre si e não se cancelam. Por isso, é uma molécula polar. A polaridade é uma das razões pelas quais a água é um solvente tão bom para compostos iônicos.
Na comparação entre o e a , você viu que a forma de uma molécula poliatômica define sua polaridade. O mesmo é válido para moléculas mais complexas. Por exemplo, os átomos e as ligações são os mesmos no cis-dicloroeteno e no trans-dicloroeteno; mas, neste último, as ligações apontam para direções opostas e os dipolos (que estão sobre as ligações ) se cancelam. Assim, enquanto o cis-dicloroeteno é polar, o trans-dicloroeteno é não polar.
Se os quatro átomos ligados ao átomo central de uma molécula tetraédrica forem iguais, como no tetraclorometano (tetracloreto de carbono), , os momentos de dipolo se cancelam e a molécula é não polar. Entretanto, se um ou mais átomos terminais forem substituídos por átomos diferentes, como no triclorometano (clorofórmio), , ou por pares isolados, como no caso do , então os momentos de dipolo associados às ligações não se cancelam. Por isso, a molécula é polar.
Uma molécula diatômica é polar se sua ligação for polar. Uma molécula poliatômica é polar se tiver ligações polares orientadas no espaço de maneira que os momentos de dipolo associados às ligações não se cancelem.