As leis de velocidade e as constantes de velocidade permitem a compreensão dos processos moleculares das mudanças químicas. Embora um mecanismo de reação possa ser estabelecido experimentalmente, algumas questões sobre as razões pelas quais as constantes de velocidade das etapas individuais têm os valores que têm e por que variam com a temperatura precisam ser respondidas.

O efeito da temperatura

As velocidades das reações químicas dependem da temperatura. A observação qualitativa é que muitas reações acontecem mais rapidamente quando a temperatura aumenta. Um aumento de 10 °C\pu{10 \degree C} na temperatura normal dobra, em geral, a velocidade de reação de espécies orgânicas em solução. É por isso que os alimentos precisam ser cozidos. O aquecimento acelera os processos que levam à ruptura das membranas celulares e à decomposição das proteínas. Por outro lado, os alimentos são refrigerados para retardar as reações químicas naturais que levam à sua decomposição.

A mudança da constante de velocidade em função da temperatura resume a variação da velocidade de reação com a temperatura. Se a constante de velocidade aumenta com a temperatura, então a reação avança mais rapidamente para determinada quantidade de reagentes. No final do século XIX, o químico sueco Svante Arrhenius investigou o efeito quantitativo da temperatura nas velocidades de reações e descobriu que o gráfico do logaritmo da constante de velocidade (lnk\ln k) contra o inverso da temperatura absoluta (1/T1/T) é uma linha reta. Ele mostrou que lnk=lnAEaRT(1a) \ln k = \ln A - \dfrac{ E_\mathrm{a} }{ RT } \tag{1a} Uma forma alternativa dessa expressão, obtida tomando-se os antilogaritmos de ambos os lados, é k=AeEa/RT(1b) k = A e^{ -E_\mathrm{a}/RT } \tag{1b} As duas constantes, AA e EaE_\mathrm{a}, são conhecidas como parâmetros de Arrhenius da reação e são determinadas experimentalmente. AA é chamado de fator pré-exponencial, e EaE_\mathrm{a} é a energia de ativação. AA e EaE_\mathrm{a} são praticamente independentes da temperatura, mas dependem da reação que está sendo estudada. A equação de Arrhenius é aplicável a reações de qualquer ordem.

Exemplo 2J.1.1
Cálculo da energia de ativação usando o gráfico lnk×1/T\ln k \times 1/T

A constante de velocidade da reação de segunda ordem entre bromoetano e íons hidróxido em água, CX2HX5Br(aq)+OHX(aq)CX2HX5OH(aq)+BrX(aq) \ce{ C2H5Br(aq) + OH^-(aq) -> C2H5OH(aq) + Br^-(aq) } foi medida em várias temperaturas, com os seguintes resultados:

Calcule a energia de ativação da reação.

Etapa 2. Calcule o coeficiente angular da reta usando dois pontos no gráfico.

Tomando os pontos AA e BB: coef. angular=9(6)3,43,1×1000 K=1104 K \text{coef. angular} = \dfrac{ -9 - (-6) }{ \pu{3,4} - \pu{3,1} } \times \pu{1000 K} = \pu{-1e4 K}

Etapa 3. Calcule a energia de ativação.

Como o coeficiente angular é igual a Ea/R-E_\mathrm{a}/R, Ea=8,31 JK1mol1×(1104 K)=83 kJmol1 E_\mathrm{a} = - \pu{8,31 J.K-1.mol-1} \times (\pu{-1e4 K}) = \fancyboxed{ \pu{83 kJ.mol-1} }

Dizemos que as reações que dão uma linha reta em um gráfico de lnk\ln k contra 1/T1/T têm comportamento de Arrhenius. Uma grande variedade de reações tem comportamento de Arrhenius. Por exemplo, os vaga-lumes piscam mais rapidamente em noites mais quentes do que em noites mais frias, e a velocidade dos pulsos é do tipo Arrhenius em uma faixa estreita de temperaturas. Essa observação sugere que as reações bioquímicas responsáveis pelos pulsos de luz têm constantes de velocidade que aumentam com a temperatura de acordo com a Equação 1.

Como a inclinação do gráfico de Arrhenius é proporcional a EaE_\mathrm{a}, segue-se que, quanto maior for a energia de ativação maior será a variação da constante de velocidade com a temperatura. As reações que têm energias de ativação baixas (ao redor de 10 kJmol1\pu{10 kJ.mol-1}, com gráficos de Arrhenius não muito inclinados) têm velocidades que crescem muito pouco com a temperatura. As reações que têm energias de ativação altas (acima de 60 kJmol1\pu{60 kJ.mol-1}, aproximadamente, com gráficos de Arrhenius muito inclinados) têm velocidades que dependem fortemente da temperatura (Figura 1).

Variação da constante de velocidade com a temperatura de duas reações que têm energias de ativação diferentes. Quanto maior for a energia de ativação, mais fortemente a constante de velocidade dependerá da temperatura.
Figura 2J.1.1

A equação de Arrhenius é usada na predição do valor de uma constante de velocidade em uma temperatura a partir de seu valor em outra temperatura.

Demonstração 2J.1.1
Como isso é feito?

As equações de Arrhenius nas duas temperaturas, T1T_1 e T2T_2, quando as constantes de velocidade da reação têm os valores k1k_1 e k2k_2, respectivamente, são Em T1:lnk1=lnAEaRT1Em T2:lnk2=lnAEaRT2 \begin{aligned} \text{Em $T_1$:} \quad \ln k_1 &= \ln A - \dfrac{ E_\mathrm{a} }{ RT_1 } \\ \text{Em $T_2$:} \quad \ln k_2 &= \ln A - \dfrac{ E_\mathrm{a} }{ RT_2 } \end{aligned} Elimine lnA\ln A subtraindo a primeira equação da segunda: lnk2lnk1ln(k2/k1)=EaRT2+EaRT1 \overbrace{ \ln k_2 - \ln k_1 }^{ \ln (k_2/k_1) } = - \dfrac{ E_\mathrm{a} }{ RT_2 } + \dfrac{ E_\mathrm{a} }{ RT_1 }

A expressão obtida pode ser rearranjada como ln(k2k1)=EaR(1T21T1)(2) \ln \left( \dfrac{k_2}{k_1} \right) = -\dfrac{ E_\mathrm{a} }{ R } \left( \dfrac{1}{T_2} - \dfrac{1}{T_1} \right) \tag{2} Essa expressão tem a seguinte interpretação:

  • Quando T2>T1T_2 > T_1, o lado direito é positivo, logo ln(k2/k1)\ln (k_2/k_1) é positivo, isto é, k2>k1k_2 > k_1. Isso significa que a constante de velocidade cresce com a temperatura.
  • Para valores fixos de T1T_1 e T2T_2, ln(k2/k1)\ln(k_2/k_1) é grande quando EaE_\mathrm{a} for grande. Logo, o aumento da constante de velocidade é grande quando a ativação for grande.
Exemplo 2J.1.2
Cálculo da constante de velocidade em uma nova temperatura usando a energia de ativação.

A hidrólise da sacarose é uma parte do processo digestivo. A constante de velocidade é k=1 mLmol1s1k = \pu{1 mL.mol-1.s-1} a 37 °C\pu{37 \degree C} (temperatura normal do corpo). A energia de ativação da reação é 100 kJmol1\pu{100 kJ.mol-1}.

Calcule a constante de velocidade da hidrólise da sacarose em 37 °C\pu{37 \degree C}.

Etapa 2. Calcule a razão entre as constantes de velocidade.

De ln(k2k1)=EaR(1T21T1)\ln\left( \frac{k_2}{k_1} \right) = -\frac{E_\mathrm{a}}{R} \left( \frac{1}{T_2} - \frac{1}{T_1} \right): ln(k2k1)=1105 Jmol18,31 JK1mol1×(1310 K1308 K)=0,27 \begin{aligned} \ln \left( \frac{k_2}{k_1} \right) = \dfrac{ \pu{1e5 J.mol-1} }{ \pu{8,31 J.K-1.mol-1} } \times \left( \dfrac{1}{\pu{310 K}} - \dfrac{1}{\pu{308 K}} \right) = \pu{0,27} \end{aligned} Tomando-se os antilogaritmos: k2k1=e0,27=0,76 \dfrac{ k_2 }{ k_1 } = e^{ \pu{-0,27} } = \pu{0,76}

Etapa 3. Calcule a constante de velocidade a 35 °C\pu{35 \degree C}.

k2=1 mLmol1s1×0,76=0,76 mLmol1s1 k_2 = \pu{1 mL.mol-1.s-1} \times \pu{0,76} = \fancyboxed{ \pu{0,76 mL.mol-1.s-1} }

Usa‑se um gráfico de Arrhenius de lnk\ln k versus 1/T1/T para determinar os parâmetros de Arrhenius de uma reação. Uma energia de ativação grande significa que a constante de velocidade é muito sensível a mudanças de temperatura.