Os mesmos princípios usados para discutir as variações de entalpia em processos físicos são válidos para as transformações químicas. As entalpias das reações químicas são importantes em muitas áreas da química, como a seleção de materiais para bons combustíveis, o projeto de instalações químicas e o estudo dos processos bioquímicos. Em muitos casos, é importante conhecer a capacidade de uma reação de produzir calor (como na queima de um combustível).

A entalpia de reação

Qualquer reação química é acompanhada por transferência de energia, comumente na forma de calor. A reação completa com o oxigênio, por exemplo, é chamada de combustão, como na combustão do metano, o componente principal do gás natural. A calorimetria mostra que a queima de 1 mol\pu{1 mol} de CHX4(g)\ce{CH4(g)} produz 890 kJ\pu{890 kJ} de calor em 298 K\pu{298 K} e 1 bar\pu{1 bar}. Esse valor é expresso da seguinte forma: CHX4(g)+2OX2(g)COX2(g)+2HX2O(l)ΔH=890 kJ \ce{ CH4(g) + 2 O2(g) -> CO2(g) + 2 H2O(l) }\quad \Delta H = \pu{-890 kJ} Essa expressão completa é uma equação termoquímica e consiste em uma equação química associada à expressão da entalpia de reação, isto é, a variação de entalpia do processo correspondente. Os coeficientes estequiométricos indicam o número de mols de cada reagente que dá a variação de entalpia registrada. No caso apresentado, a variação de entalpia é a que resulta da reação completa de 1 mol\pu{1 mol} de CHX4\ce{CH4} e 2 mol\pu{2 mol} de OX2\ce{O2}. Se a mesma reação for escrita com todos os coeficientes dobrados, então a variação de entalpia seria duas vezes maior, porque a equação representaria a combustão do dobro da quantidade de metano: 2CHX4(g)+4OX2(g)2COX2(g)+4HX2O(l)ΔH=1790 kJ \ce{ 2 CH4(g) + 4 O2(g) -> 2 CO2(g) + 4 H2O(l) }\quad \Delta H = \pu{-1790 kJ} Observe que, embora a queima ocorra em temperaturas elevadas, o valor de ΔH\Delta H dado aqui é determinado pela diferença de entalpia entre produtos e reagentes, medida em 298 K\pu{298 K}.

A primeira lei da termodinâmica diz que, como a entalpia é uma função de estado, a variação de entalpia do processo inverso (uma reação química, por exemplo) é o negativo da variação de entalpia do processo direto. Para a reação inversa: COX2(g)+2HX2O(l)CHX4(g)+2OX2(g)ΔH=+890 kJ \ce{ CO2(g) + 2 H2O(l) -> CH4(g) + 2 O2(g) }\quad \Delta H = \pu{+890 kJ}

Exemplo 3A.3.1
Cálculo da entalpia de reação a partir de dados calorimétricos em pressão constante

Uma amostra de 0,117 g\pu{0,117 g} de benzeno, CX6HX6\ce{C6H6}, foi queimada com excesso de oxigênio em um calorímetro de pressão constante calibrado cuja capacidade calorífica é 600 JK1\pu{600 J.K-1}. A temperatura do calorímetro aumentou 8 °C\pu{8 \degree C}.

Calcule a entalpia de combustão do benzeno.

Etapa 2. Escreva a reação de combustão do benzeno.

CX6HX6(l)+152OX2(g)12COX2(g)+6HX2O(l) \ce{ C6H6(l) + 15/2 O2(g) -> 12 CO2(g) + 6 H2O(l) }

Etapa 3. Calcule o calor transferido para o calorímetro.

De q=Qcal=CcalΔTq = -Q_\mathrm{cal} = -C_\mathrm{cal} \Delta T q=(600 JK)×(8 K)=4,8 kJ q = - (\pu{600 J//K}) \times (\pu{8 K}) = \pu{-4,8 kJ}

Etapa 4. Calcule a quantidade de benzeno que reagiu.

De n=m/Mn = m/M n=0,117 g78 gmol=1,5 mmol n = \dfrac{ \pu{0,117 g} }{ \pu{78 g//mol} } = \pu{1,5 mmol}

Etapa 5. Calcule a entalpia de combustão por mol.

ΔH=4,8 kJ1,5 mmol=3,2 MJmol1 \Delta H = - \dfrac{ \pu{-4,8 kJ} }{ \pu{1,5 mmol} } = \fancyboxed{ \pu{-3,2 MJ.mol-1} } A variação na entalpia é negativa, o que é esperado dado que as reações de combustão são exotérmicas.

A relação entre entalpia e energia de reação

Um calorímetro de pressão constante e um calorímetro de bomba medem variações de funções de estado diferentes: em volume constante, a transferência de calor é interpretada como ΔU\Delta U e, em pressão constante, como ΔH\Delta H. Pode vir a ser necessário converter o valor medido de ΔU\Delta U em ΔH\Delta H. Por exemplo, é fácil medir o calor liberado pela combustão da glicose em um calorímetro de bomba, que tem volume constante, mas para usar essa informação no cálculo de variações de energia no metabolismo, que ocorre em pressão constante, é necessário usar a entalpia de reação.

No caso de reações em que gases não são produzidos nem consumidos, a diferença entre ΔH\Delta H e ΔU\Delta U é desprezível e podemos considerar ΔHΔU\Delta H \approx \Delta U. Entretanto, se um gás é formado na reação, muito trabalho é realizado para dar lugar aos produtos gasosos, de modo que a diferença pode ser significativa. Uma vez mais, se os gases se comportam idealmente, a lei dos gases ideais pode ser usada para relacionar os valores de ΔH\Delta H e ΔU\Delta U.

Demonstração 3A.3.1
Relação entre ΔH\Delta H e ΔU\Delta U

Suponha que a quantidade de molécula de gás ideal nos reagentes seja ngaˊs,1n_{\text{gás}, 1}. A entalpia inicial é: H1=U1+P1V1=U1+ngaˊs,1RT H_1 = U_1 + P_1V_1 = U_1 + n_{\text{gás}, 1} RT Depois que a reação se completou, a quantidade de moléculas de gás ideal produzidas é ngaˊs,2n_{\text{gás}, 2}. A entalpia final é: H2=U2+P2V2=U2+ngaˊs,2RT H_2 = U_2 + P_2V_2 = U_2 + n_{\text{gás}, 2} RT A diferença é: ΔH=ΔU+(ngaˊs,2ngaˊs,1)RT \Delta H = \Delta U + ( n_{\text{gás}, 2} - n_{\text{gás}, 1} ) RT

Concluímos que: ΔH=ΔU+ΔngaˊsRT \Delta H = \Delta U + \Delta n_\text{gás} RT em que Δngaˊs\Delta n_\text{gás} é a variação da quantidade de moléculas de gás na reação.

O que esta equação revela?
  • Menos energia pode ser obtida na forma de calor sob pressão constante do que em volume constante, porque o sistema tem de usar energia para expandir o volume e acomodar os gases produzidos.
Exemplo 3A.3.2
Cálculo da entalpia de reação a partir de dados calorimétricos em volume constante

Uma amostra de 1 mmol\pu{1 mmol} de glicose, CX6HX12OX6\ce{C6H12O6}, foi queimada com excesso de oxigênio em um calorímetro de volume constante. A reação gerou 2,6 kJ\pu{2,6 kJ} de calor em 400 K\pu{400 K}.

Calcule a entalpia de combustão da glicose.

Etapa 2. Escreva a reação de combustão da glicose.

CX6HX12OX6(s)+6OX2(g)6COX2(g)+6HX2O(g) \ce{ C6H12O6(s) + 6 O2(g) -> 6 CO2(g) + 6 H2O(g) }

Etapa 3. Calcule a energia interna de combustão por mol.

ΔU=2,6 J1 mmol=2600 kJmol1 \Delta U = - \dfrac{ \pu{-2,6 J} }{ \pu{1 mmol} } = \pu{-2600 kJ.mol-1}

Etapa 4. Calcule a variação no número de mols de gás por mol de reação.

Δngaˊs=126=6 \Delta n_\text{gás} = 12 - 6 = 6

Etapa 5. Calcule a entalpia de combustão por mol.

De ΔH=ΔU+ΔngaˊsRT\Delta H = \Delta U + \Delta n_\text{gás} RT ΔH=(2600 kJmol)+6×(8,3103 kJKmol)×(400 K)=2585 kJmol1 \begin{aligned} \Delta H &= (\pu{-2600 kJ//mol}) + \pu{6} \times (\pu{8,3e-3 kJ//K.mol}) \times (\pu{400 K}) \\ &= \fancyboxed{ \pu{-2585 kJ.mol-1} } \end{aligned}

As entalpias padrão de reação

Como o calor liberado ou absorvido em uma reação depende dos estados físicos dos reagentes e produtos, é necessário especificar o estado de cada substância. Por exemplo, ao descrever a combustão do eteno, podemos escrever duas equações termoquímicas diferentes para dois conjuntos diferentes de produtos: CX2HX4(g)+3OX2(g)2COX2(g)+2HX2O(g)ΔH=1323 kJCX2HX4(g)+3OX2(g)2COX2(g)+2HX2O(l)ΔH=1411 kJ \begin{aligned} \ce{ C2H4(g) + 3 O2(g) &-> 2 CO2(g) + 2 H2O(g) } && \Delta H = \pu{-1323 kJ} \\ \ce{ C2H4(g) + 3 O2(g) &-> 2 CO2(g) + 2 H2O(l) } && \Delta H = \pu{-1411 kJ} \end{aligned} Na primeira reação, a água é produzida como vapor, e na segunda, como líquido. O calor produzido é diferente nos dois casos. A entalpia do vapor de água é 44 kJmol1\pu{44 kJ.mol-1} maior do que a da água líquida, em 25 °C\pu{25 \degree C}. Como resultado, um excesso de 88 kJmol1\pu{88 kJ.mol-1} permanece armazenado no sistema se vapor de água é formado.

A entalpia de reação depende também das condições (como a pressão). A entalpia padrão de reação, ΔH\Delta H^\circ, é a entalpia de reação quando os reagentes, em seus estados padrão, isto é, na sua forma pura, em exatamente 1 bar\pu{1 bar}, transformam-se em produtos, também em seus estados padrão. A maior parte dos dados termodinâmicos é registrada para 298 K\pu{298 K}, A temperatura não faz parte da definição dos estados padrão. Um estado padrão pode ser definido em qualquer temperatura.

Um tipo especial de reação que desempenha um papel importante na termodinâmica, assim como no mundo real, é a combustão. Conhecer o calor que pode ser obtido com a queima de um combustível é importante na avaliação de fontes de energia. A entalpia padrão de combustão, ΔHc\Delta H_\mathrm{c}^\circ, é a variação da entalpia por mol de uma substância queimada em uma reação de combustão em condições padrão.

Exemplo 3A.3.3
Cálculo do calor liberado por um combustível

Calcule a massa de oxigênio necessária para fornecer 330 kJ\pu{330 kJ} de calor por combustão com butano.

  • ΔHc(CX4HX10)=2860 kJmol1\Delta H_\mathrm{c}(\ce{C4H10}) = \pu{-2860 kJ.mol-1}
Etapa 2. Escreva a reação de combustão do butano.

CX4HX10(g)+132OX2(g)8COX2(g)+10HX2O(l) \ce{ C4H10(g) + 13/2 O2(g) -> 8 CO2(g) + 10 H2O(l) }

Etapa 3. Converta o calor liberado necessário na quantidade de oxigênio.

n=132×330 kJ2860 kJmol=0,75 mol n = \dfrac{13}{2} \times \dfrac{ \pu{330 kJ} }{ \pu{2860 kJ//mol} } = \pu{0,75 mol}

Etapa 4. Converta a quantidade de oxigênio em massa.

De m=nMm = n M m=0,75 mol×32 gmol1=24 g m = \pu{0,75 mol} \times \pu{32 g.mol-1} = \fancyboxed{ \pu{24 g} }

O calor absorvido ou liberado por uma reação pode ser tratado como um reagente ou um produto em um cálculo estequiométrico.

A Lei de Hess

A entalpia é uma função de estado, logo, o valor de ΔH\Delta H é independente do caminho entre os estados inicial e final. Vimos que a variação de entalpia pode ser expressa como a soma das variações de entalpia de uma série de etapas. O mesmo aplica-se a reações químicas e, nesse contexto, ela é conhecida como lei de Hess:

  • A entalpia total da reação é a soma das entalpias de reação das etapas em que a reação pode ser dividida.

A lei de Hess aplica-se mesmo que as reações intermediárias ou a reação total não possam ser realizadas na prática. Isto é, elas podem ser hipotéticas. Conhecidas as equações balanceadas de cada etapa e sabendo que a soma dessas equações é igual à equação da reação de interesse, a entalpia de reação pode ser calculada a partir de qualquer sequência conveniente de reações.

Como exemplo da lei de Hess, considere a oxidação do carbono, na forma de grafita, representado por C(gr)\ce{C(gr)}, a dióxido de carbono C(gr)+OX2(g)COX2(g) \ce{ C(gr) + O2(g) -> CO2(g) } Pode-se imaginar que essa reação aconteça em duas etapas: a oxidação do carbono a monóxido de carbono, seguida da oxidação do monóxido de carbono a dióxido de carbono. A equação da reação total é a soma das equações das etapas intermediárias: C(gr)+12OX2(g)CO(g)ΔH=110 kJCO(g)+12OX2(g)COX2(g)ΔH=280 kJC(gr)+OX2(g)COX2(g)ΔH=390 kJ \begin{aligned} \ce{ C(gr) + 1/2 O2(g) &-> CO(g) } && \Delta H = \pu{-110 kJ} \\ \ce{ CO(g) + 1/2 O2(g) &-> CO2(g) } && \Delta H = \pu{-280 kJ} \\[1ex] \hline \\[-2ex] \ce{ C(gr) + O2(g) &-> CO2(g) } && \Delta H = \pu{-390 kJ} \end{aligned}

Exemplo 3A.3.4
Cálculo da entalpia de reação usando a lei de Hess

A gasolina, que contém octano, pode queimar até monóxido de carbono se o fornecimento de ar for reduzido.

Calcule a entalpia de combustão incompleta do octano líquido formando monóxido de carbono e água líquida.

  • ΔHc(CX8HX18,l)=5,5 MJmol\Delta H^\circ_\mathrm{c}(\ce{C8H18, l}) = \pu{-5,5 MJ//mol}
  • ΔHc(CO,g)=280 kJmol\Delta H^\circ_\mathrm{c}(\ce{CO, g}) = \pu{-280 kJ//mol}
Etapa 2. Escreva a reação de interesse como uma composição das reações fornecidas.

CX8HX18(l)+252OX2(g)8COX2(g)+9HX2O(l)8COX2(g)8CO(g)+4OX2(g)CX8HX18(l)+172OX2(g)8CO(g)+9HX2O(l) \begin{aligned} \ce{ C8H18(l) + 25/2 O2(g) &-> 8 CO2(g) + 9 H2O(l) } \\ \ce{ 8 CO2(g) &-> 8 CO(g) + 4 O2(g) } \\[1ex] \hline \\[-2ex] \ce{ C8H18(l) + 17/2 O2(g) &-> 8 CO(g) + 9 H2O(l) } \end{aligned}

Etapa 3. Calcule a entalpia de reação.

ΔHr={(5500)8(280)}kJmol=3260 kJmol1 \begin{aligned} \Delta H^\circ_\mathrm{r} &= \Big\{ (\pu{-5500}) - 8 (\pu{-280}) \Big\} \, \pu{kJ//mol} \\ &= \fancyboxed{ \pu{-3260 kJ.mol-1} } \end{aligned}

Equações termoquímicas podem ser combinadas para dar a equação termoquímica da reação total.

As entalpias padrão de formação

Existem milhões de reações possíveis, e seria impraticável listar cada uma com sua entalpia padrão de reação. Os químicos, porém, inventaram uma alternativa engenhosa. Inicialmente, eles registram a entalpia padrão de formação das substâncias. Depois, combinam essas quantidades para obter a entalpia da reação desejada.

A entalpia padrão de formação, ΔHf\Delta H_\mathrm{f}^\circ, de uma substância é a entalpia padrão da reação por mol de fórmula unitária da formação de uma substância a partir de seus elementos na sua forma mais estável, como na reação de formação do etanol: 2C(gr)+3HX2(g)+12OX2(g)CX2HX5OH(l)ΔH=278 kJ \ce{ 2 C(gr) + 3 H2(g) + 1/2 O2(g) -> C2H5OH(l) }\quad \Delta H^\circ = \pu{-278 kJ} em que C(gr)\ce{C(gr)} significa grafita, a forma mais estável do carbono na temperatura normal. A equação química que corresponde à entalpia padrão de formação de uma substância tem um só produto com o coeficiente estequiométrico igual a 1 (o que implica a formação de 1 mol\pu{1 mol} de substância). Algumas vezes, como aqui, coeficientes fracionários são necessários para os reagentes. Como as entalpias padrão de formação são expressas em quilojoules por mol da substância de interesse, neste caso ΔHf(CX2HX5OH,l)=278 kJmol1\Delta H_\mathrm{f}^\circ (\ce{C2H5OH, l}) = \pu{-278 kJ.mol-1}. Observe também como a variação da entalpia é informada, de maneira que uma espécie e seu estado (líquido, neste caso) sejam representadas na forma correta.

A partir da definição anterior, temos que a entalpia padrão de formação de um elemento na sua forma mais estável é zero. Por exemplo, a entalpia padrão de formação de C(gr)\ce{C(gr)} é zero porque C(gr)C(gr)\ce{ C(gr) -> C(gr) } é uma reação vazia (isto é, nada muda). Neste caso, ΔHf(C,gr)=0\Delta H_\mathrm{f}^\circ (\ce{C, gr}) = 0. A entalpia de formação de um elemento em uma forma que não é a mais estável, entretanto, é diferente de zero. Por exemplo, a conversão do carbono da grafita (a forma mais estável) em diamante é endotérmica: C(gr)C(diamante)ΔH=+1,9 kJ \ce{ C(gr) -> C(diamante) }\quad \Delta H^\circ = \pu{+1,9 kJ} A entalpia padrão de formação do diamante é, portanto, registrada como ΔHf(C,diamante)=+1,9 kJmol1\Delta H_\mathrm{f}^\circ (\ce{C, diamante}) = \pu{+1,9 kJ.mol-1}.

Tabela 3A.3.1
Formas mais estáveis dos elementos a 25 °C\pu{25 \degree C} e 1 bar\pu{1 bar}
ElementoForma mais estável
HX2,OX2,ClX2,Xe\ce{H2}, \ce{O2}, \ce{Cl2}, \ce{Xe}Gás
BrX2,Hg\ce{Br2}, \ce{Hg}Líquido
C\ce{C}Grafite
Na,Fe,IX2\ce{Na}, \ce{Fe}, \ce{I2}Sólido

Para saber como combinar entalpias padrão de formação a fim de obter uma entalpia padrão de reação, imagine que, para executar a reação, os reagentes são antes convertidos nos elementos em suas formas mais estáveis e, depois, os produtos são formados a partir desses elementos. A entalpia padrão de reação da primeira etapa é o valor negativo das entalpias padrão de formação de todos os reagentes (os reagentes estão sendo decompostos em seus elementos constituintes), e da segunda etapa é a soma das entalpias padrão de formação de todos os produtos, ambas em função da quantidade presente: ΔH=produtosnΔHfreagentesnΔHf \Delta H^\circ = \sum_\text{produtos} n \Delta H^\circ_\mathrm{f} - \sum_\text{reagentes} n \Delta H^\circ_\mathrm{f} Nessa expressão, os valores de nn são os coeficientes estequiométricos da equação química.

Exemplo 3A.3.5
Cálculo da entalpia padrão de reação a partir das entalpias padrão de formação

A produção de aço a partir do minério de ferro é representada pela reação: 2FeX2OX3(s)+3C(s)4Fe(s)+3COX2(g) \ce{ 2 Fe2O3(s) + 3 C(s) -> 4 Fe(s) + 3 CO2(g) } Calcule a entalpia padrão de redução do óxido de ferro.

  • ΔHf(FeX2OX3,s)=824 kJmol\Delta H^\circ_\mathrm{f}(\ce{Fe2O3, s}) = \pu{-824 kJ//mol}
  • ΔHf(COX2,g)=394 kJmol\Delta H^\circ_\mathrm{f}(\ce{CO2, g}) = \pu{-394 kJ//mol}
Etapa 2. Calcule a entalpia padrão de reação.

De ΔHr=produtosnΔHfreagentesnΔHf\Delta H_\mathrm{r}^\circ = \sum_\text{produtos} n \Delta H^\circ_\mathrm{f} - \sum_\text{reagentes} n \Delta H^\circ_\mathrm{f} ΔHr=3ΔHf,COX2(g)2ΔHf,FeX2OX3(s) \Delta H_\mathrm{r}^\circ = 3 \Delta H^\circ_{\mathrm{f}, \ce{CO2(g)}} - 2 \Delta H^\circ_{\mathrm{f}, \ce{Fe2O3(s)}} logo, ΔHr={3(394)2(824)}kJmol=+466 kJmol1 \begin{aligned} \Delta H_\mathrm{r}^\circ &= \Big\{ 3 (\pu{-394}) - 2 (\pu{-824}) \Big\}\,\pu{kJ//mol} \\ &= \fancyboxed{ \pu{+466 kJ.mol-1} } \end{aligned}

As entalpias padrão de formação podem ser combinadas para dar a entalpia padrão de qualquer reação.

A entalpia de reação e a temperatura

Em alguns casos, você conhece a entalpia de reação de uma temperatura mas precisa do valor para outra temperatura. As entalpias dos reagentes e produtos aumentam com a temperatura. Se a entalpia total dos reagentes aumenta mais do que a dos produtos quando a temperatura se eleva, então a entalpia de reação de uma reação exotérmica fica mais negativa, como na Fig. 3A.3.1. Por outro lado, se a entalpia dos produtos aumenta mais do que a dos reagentes quando a temperatura se eleva, então a entalpia de reação fica menos negativa. O aumento de entalpia de uma substância quando a temperatura cresce depende de sua capacidade calorífica sob pressão constante, CP=ΔH/ΔTC_P = \Delta H/\Delta T.

Se a capacidade calorífica dos reagentes é maior do que a dos produtos, a entalpia dos reagentes crescerá mais rapidamente com o aumento de temperatura. Se a reação é exotérmica, como neste caso, a entalpia de reação ficará mais negativa.
Figura 3A.3.1

Para calcular a entalpia de reação em uma temperatura diferente, podemos aproveitar o fato de que a entalpia é função de estado para propor um caminho alternativo:

  1. Levar os reagentes da temperatura de interesse até 298 K\pu{298 K}.
  2. Conduzir a reação em 298 K\pu{298 K}.
  3. Levar os produtos de 298 K\pu{298 K} até a temperatura de interesse.

Como os estados inicial e final são os reagentes e produtos na temperatura de interesse, esse processo possui a mesma variação de entalpia do que a reação na temperatura de interesse, temos: Lei de Kirchhoff:ΔHT2=ΔHT1+(T2T1)×ΔCP \fancyboxed{ \text{Lei de Kirchhoff:}\quad \Delta H_{T_2}^\circ = \Delta H_{T_1}^\circ + (T_2 - T_1) \times \Delta C_P } em que ΔCP\Delta C_P é a diferença entre as capacidades caloríficas em pressão constante dos produtos e reagentes: ΔCP=produtosnCPreagentesnCP \Delta C_P = \sum_\text{produtos} n C_P - \sum_\text{reagentes} n C_P

Exemplo 3A.3.6
Cálculo da entalpia de reação em uma temperatura diferente

A entalpia padrão de formação da amônia, NX2(g)+3HX2(g)2NHX3(g) \ce{ N2(g) + 3 H2(g) -> 2 NH3(g) } é 92 kJmol1\pu{-92 kJ.mol-1} em 298 K\pu{298 K}.

Calcule a entalpia de síntese de amônia a 425 °C\pu{425 \degree C}.

  • CP(NX2,g)=29 JKmolC_{P}(\ce{N2, \text{g}}) = \pu{29 J//K.mol}
  • CP(HX2,g)=28 JKmolC_{P}(\ce{H2, \text{g}}) = \pu{28 J//K.mol}
  • CP(NHX3,g)=35 JKmolC_{P}(\ce{NH3, \text{g}}) = \pu{35 J//K.mol}
Etapa 2. Calcule ΔCP\Delta C_P.

De ΔCP=produtosnCPreagentesnCP,\Delta C_P = \sum_\text{produtos} n C_P - \sum_\text{reagentes} n C_P, ΔCP=2CP,NHX3CP,NX23CP,HX2 \Delta C_P = 2 C_{P, \ce{NH3}} - C_{P, \ce{N2}} - 3 C_{P, \ce{H2}} logo, ΔCP={2(35)(29)3(28)}JKmol=43 JK1mol1 \Delta C_P = \Big\{ 2(\pu{35}) - (\pu{29}) - 3(\pu{28}) \Big\}\,\pu{J//K.mol} = \pu{-43 J.K-1.mol-1}

Etapa 3. Calcule a entalpia de reação 425 °C\pu{425 \degree C}.

De ΔHT2=ΔHT1+(T2T1)×ΔCP,\Delta H_{T_2}^\circ = \Delta H_{T_1}^\circ + (T_2 - T_1) \times \Delta C_P, ΔH425 °C=(92 kJmol)+(400 K)×(43 JKmol)=102 kJmol1 \begin{aligned} \Delta H_{\pu{425 \degree C}}^\circ &= (\pu{-92 kJ//mol}) + (\pu{400 K}) \times (\pu{-43 J//K.mol}) \\ &= \fancyboxed{ \pu{-102 kJ.mol-1} } \end{aligned}

Como a diferença entre ΔHT2\Delta H_{T_2}^\circ e ΔHT1\Delta H_{T_1}^\circ depende da diferença das capacidades caloríficas dos reagentes e produtos — uma diferença que normalmente é pequena — na maior parte dos casos, a entalpia de reação varia muito pouco com a temperatura e, para pequenas diferenças de temperatura, pode ser tratada como constante.

A variação da entalpia padrão de reação com a temperatura é dada pela lei de Kirchhoff.