As reações redox que têm energia livre de Gibbs de reação positiva não são espontâneas, mas a corrente elétrica pode ser usada para direcioná-la no sentido direto. Por exemplo, o flúor não pode ser isolado mediante reações químicas comuns. Ele não foi isolado até 1886, quando o químico francês Henri Moissan encontrou um procedimento para formar o flúor ao passar uma corrente elétrica por uma mistura anidra fundida de fluoreto de potássio e fluoreto de hidrogênio. Ainda hoje, o flúor é preparado comercialmente por esse processo.

As células eletrolíticas

A célula eletrolítica é a célula eletroquímica na qual ocorre a eletrólise. O arranjo dos componentes das células eletrolíticas é diferente do arranjo da célula galvânica. Em geral, os dois eletrodos ficam no mesmo compartimento, só existe um tipo de eletrólito e as concentrações e pressões estão longe das condições padrão. Como em toda célula eletroquímica, os íons presentes transportam a corrente pelo eletrólito. Por exemplo, quando o metal cobre é refinado eletroliticamente, o anodo é cobre impuro, o catodo é cobre puro e o eletrólito é CuSOX4\ce{CuSO4}. Quando íons CuX2+\ce{Cu^{2+}} migram para o catodo, eles são reduzidos e se depositam na forma de átomos de cobre. Outros íons CuX2+\ce{Cu^{2+}} são produzidos por oxidação do metal cobre no anodo.

Ponto para pensar

Que impurezas dos metais não podem ser removidas do cobre durante o refino por eletrólise?

A Figura 3 mostra o esquema de uma célula eletrolítica usada comercialmente na produção do metal magnésio a partir do cloreto de magnésio fundido (o processo Dow). Como em uma célula galvânica, a oxidação ocorre no anodo e a redução ocorre no catodo. Os elétrons completam o circuito deslocando-se por um cabo externo. Do anodo para o catodo, os cátions movem-se através do eletrólito na direção do catodo e, os ânions, na direção do anodo. Diferentemente de uma célula galvânica, entretanto, na qual a corrente é gerada de forma espontânea, em uma célula eletrolítica ela precisa ser fornecida por uma fonte de energia elétrica externa para que a reação ocorra. O resultado é forçar a oxidação em um eletrodo e a redução no outro. As seguintes meias-reações ocorrem no processo Dow: Reduc¸a˜o no catodo:MgX+2(fund)+2eXMg(l)Oxidac¸a˜o no anodo:2ClX(fund)ClX2(g)+2eX \begin{aligned} \text{Redução no catodo:} && \ce{ Mg^{+2}(fund) + 2 e^- &-> Mg(l) } \\ \text{Oxidação no anodo:} && \ce{ 2 Cl^-(fund) &-> Cl2(g) + 2 e^- } \end{aligned} em que fund\ce{fund} representa o sal fundido que atua como eletrólito. Uma bateria recarregável funciona como célula galvânica quando está realizando trabalho e como célula eletrolítica quando está sendo recarregada.

Diagrama esquemático da célula eletrolítica usada no processo Dow para a obtenção do magnésio. O eletrólito é cloreto de magnésio fundido. Os íons cloreto se oxidam a gás cloro no anodo e os íons magnésio se reduzem ao metal magnésio no catodo.
Figura 3K.3.1

Para forçar uma reação em um sentido não espontâneo, a fonte externa deve gerar uma diferença de potencial maior do que a diferença de potencial que seria produzida pela reação inversa. Por exemplo, como 2HX2(g)+OX2(g)2HX2O(l)Eceˊlula=+1,23 V \ce{ 2 H2(g) + O2(g) -> 2 H2O(l) } \quad E_\text{célula} = \pu{+1,23 V} para atingir a reação reversa não espontânea, 2HX2O(l)2HX2(g)+OX2(g)Eceˊlula=1,23 V \ce{ 2 H2O(l) -> 2 H2(g) + O2(g) } \quad E_\text{célula} = \pu{-1,23 V} em condições padrão (exceto pela concentração de HX+\ce{H^+}, que é 1107 molL1\pu{1e-7 mol.L-1} em água pura em 298 K\pu{298 K}) no mínimo 1,23 V\pu{1,23 V} precisa ser disponibilizado pela fonte externa para superar o poder de empurrar, natural da reação, na direção oposta. Na prática, a diferença de potencial aplicada tem de ser significativamente superior à do potencial de célula, para inverter a reação espontânea e obter uma velocidade significativa de formação de produto. A diferença de potencial adicional, que varia de acordo com o tipo de eletrodo, é chamada de sobrepotencial. No caso dos eletrodos de platina, o sobrepotencial necessário para a produção de hidrogênio e oxigênio a partir da água é cerca de 0,6 V\pu{0,6 V}. Logo, é preciso empregar cerca de 1,8 V\pu{1,8 V} (0,6 V+1,23 V\pu{0,6 V} + \pu{1,23 V}) na eletrólise da água se os eletrodos usados forem de platina. O hidrogênio é uma fonte de energia limpa, e muitas pesquisas contemporâneas em células eletroquímicas buscam reduzir o sobrepotencial e, assim, aumentar a eficiência de processos eletrolíticos como a produção de hidrogênio.

O potencial fornecido a uma célula eletrolítica deve ser no mínimo igual ao potencial da reação a ser invertida. Se existe na solução mais de uma espécie que pode ser reduzida, as espécies com os maiores potenciais de redução são, preferencialmente, reduzidas. O mesmo princípio é aplicado à oxidação.

Os produtos da eletrólise

O cobre, por exemplo, é refinado eletroliticamente usando-se uma forma do metal impuro, conhecida como cobre vesiculado, como o anodo de uma célula eletrolítica. A corrente fornecida força a oxidação do cobre vesiculado a íons cobre(II), CuX2+\ce{Cu^{2+}}, que são reduzidos no catodo ao metal puro na reação: CuX2+(aq)+2eXCu(s) \ce{ Cu^{2+}(aq) + 2 e^- -> Cu(s) } Para calcular a quantidade de Cu\ce{Cu} produzida por determinada quantidade de elétrons, escreva a relação estequiométrica dessa semirreação: neX2=nCu1 \dfrac{n_{\ce{e^-}}}{2} = \dfrac{n_\ce{Cu}}{1} e, então, converta a quantidade de elétrons em quantidade de átomos de Cu\ce{Cu}. Por exemplo, se 4,0 moleX\pu{4,0 mol}\, \ce{e^-} tivessem sido fornecidos, seriam formados 2,0 mol\pu{2,0 mol} de Cu\ce{Cu}.

A quantidade de carga, QQ, que passa pela célula eletrolítica é medida em coulombs. Ela é determinada pela medida da corrente, II, e do tempo, tt, em que a corrente flui, e é calculada por Q=It Q = It Para determinar a quantidade de elétrons fornecida por uma determinada carga, usamos a constante de Faraday, FF, a quantidade de carga por mol de elétrons, como fator de conversão. Como a carga fornecida é Q=neXFQ = n_{\ce{e^-}} F, segue-se que neX=QF=ItF n_{\ce{e^-}} = \dfrac{Q}{F} = \dfrac{It}{F} Assim, se a corrente e o tempo de aplicação são conhecidos, é possível determinar a quantidade de elétrons fornecidos. A razão molar da reação do eletrodo pode então ser usada para converter a quantidade de elétrons fornecida em quantidade de produto.

Exemplo 3K.3.1
Cálculo da quantidade de produto formado na eletrólise

Alumínio é produzido por eletrólise a partir de seu óxido dissolvido em criolita fundida. A célula opera continuamente com 1105 A\pu{1e5 A}.

Calcule a massa de alumínio que pode ser produzida em um dia.

Etapa 2. Escreva a semirreação de redução do alumínio.

AlX3+(fund)+3eXAl(l) \ce{ Al^{3+}(fund) + 3 e^- -> Al(l) }

Etapa 3. Calcule o número de elétrons fornecidos.

De neX=It/Fn_{\ce{e^-}} = It/F neX=(1105 A)×(24×3600 s)96500 Cmol=90 kmol  n_{\ce{e^-}} = \dfrac{ (\pu{1e5 A}) \times (24 \times \pu{3600 s}) }{ \pu{96500 C//mol} } = \pu{ 90 kmol }

Etapa 4. Use a relação estequiométrica para converter a quantidade de eX\ce{e^-} na quantidade de Al\ce{Al}.

nAl=90 kmol×13=30 mol n_{\ce{Al}} = \pu{90 kmol} \times \dfrac{ 1 }{ 3 } = \pu{30 mol}

Etapa 5. Converta a quantidade de Al\ce{Al} em massa usando a massa molar.

De m=nMm = nM mAl=30 kmol×27 gmol=810 kg m_{\ce{Al}} = \pu{30 kmol} \times \pu{27 g//mol} = \fancyboxed{ \pu{810 kg} }

A quantidade de produto em uma reação de eletrólise é calculada pela estequiometria da meia‑reação, pela corrente e pelo tempo que ela flui.

As aplicações da eletrólise

O refino do cobre e a extração eletrolítica de alumínio, magnésio e flúor já foram descritos. Outra aplicação importante da eletrólise é a produção do metal sódio pelo processo de Downs, a eletrólise do sal-gema fundido: Reduc¸a˜o no catodo:2NaX+(aq)+2eX2Na(fund)Oxidac¸a˜o no anodo:2ClX(fund)ClX2(g)+2eX \begin{aligned} \text{Redução no catodo:} && \ce{ 2 Na^+(aq) + 2 e^- &-> 2 Na(fund) } \\ \text{Oxidação no anodo:} && \ce{ 2 Cl^-(fund) &-> Cl2(g) + 2 e^- } \end{aligned} O cloreto de sódio é abundante na forma de sal-gema, mas o sólido não conduz eletricidade porque os íons estão presos em suas posições. Os eletrodos da célula são feitos de um material inerte como o carbono; a célula é projetada para armazenar, sem contato, o sódio e o cloro produzidos na eletrólise e, também, para que não haja contato com o ar. Em uma modificação do processo de Downs, o eletrólito é uma solução de cloreto de sódio em água. Os produtos desse processo cloro-álcali são cloro e hidróxido de sódio em água.

Ponto para pensar

No processo de Downs, adiciona-se CaClX2\ce{CaCl2} ao NaCl\ce{NaCl} para reduzir seu ponto de fusão. Por que, então, não se forma o metal cálcio no catodo?

A eletrodeposição é a deposição eletrolítica de um filme fino de metal sobre um objeto. O objeto a ser recoberto (metal ou plástico coberto por grafita) é o catodo, e o eletrólito é uma solução, em água, de um sal do metal a ser depositado. O metal é depositado no catodo pela redução dos íons da solução de eletrólito. Esses cátions são fornecidos pelo sal adicionado ou pela oxidação do anodo, feito do metal de deposição.

A eletrólise é usada industrialmente para extrair metais de seus sais, para preparar o cloro, o flúor e o hidróxido de sódio e para refinar o cobre. Ela é também usada na eletrodeposição.